Polêmica sobre a taxação de compras em lojas estrangeiras feitas pela internet leva a gigante Shein a anunciar investimentos locais. O setor no País critica a concorrência desleal

Após inúmeros relatos de mercadorias devolvidas à China por falta de informações, a Receita Federal apertou o cerco sobre as remessas internacionais com valor inferior a US$ 50 (cerca de R$ 250). A legislação permite que pessoas físicas troquem mercadorias com esse valor, mas o recurso era utilizado por plataformas de e-commerce estrangeiras, como o Aliexpress, Shopee e Shein, para evitar a taxação e vender por preços módicos. O cerco a essas remessas, uma antiga reivindicação do setor varejista nacional, que alega concorrência desleal, colocou o ministro da Fazenda no meio de uma polêmica por prejudicar os consumidores nacionais, boa parte de baixa renda. Isso forçou o governo a recuar, mas teve o mérito de acelerar medidas que podem beneficiar o cidadão e o próprio setor.

A expectativa da Shein é nacionalizar 85% de suas vendas até 2026

A “invasão chinesa” não é de hoje. Sem o pagamento de tributos, as plataformas do país ganharam espaço e preferência do consumidor brasileiro. “É bom que fique claro que não há nenhuma hostilidade de quem quer que seja em relação a operação dessas plataformas internacionais. A única questão é que algumas usam uma transação entre pessoas físicas para realizar operações comerciais, trazendo um profundo desequilíbrio concorrencial com as plataformas brasileiras”, aponta Fernando Valente Pimentel, diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit). De acordo com a Receita, o Brasil recebe diariamente mais de meio milhão de encomendas internacionais comercializadas dessa forma, com taxas de crescimento superiores a 150% ao ano. Segundo estimativas do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), a evasão originada apenas no varejo digital deve alcançar entre R$ 76 bilhões e R$ 99 bilhões em 2025. “A compra sem impostos, de forma ilegal, afeta a economia e o emprego”, argumenta Jorge Gonçalves Filho, presidente do IDV, entidade que representa 71 empresas varejistas como Magazine Luiza, Renner e Casas Bahia.

“Nosso objetivo é apoiar os fabricantes e fornecedores brasileiros para que possam aumentar seu alcance e crescimento” Felipe Feistler, General Manager da Shein no Brasil

Para minimizar a polêmica, o ministro da Fazenda prometeu a empresários nacionais que vai trabalhar em um plano de adequação. A ideia é que os preços dos produtos ofertados nos sites já incorporem o imposto cobrado no Brasil, como é feito pela americana Amazon, por exemplo. “O que a gente nota é que os players internacionais querem regularizar suas vidas, querem igualdade de condições com a gente, sem burlar o sistema. São empresas respeitabilíssimas e competitivas. Eles não dependem dessa distorção para competir aqui”, declara Flávio Gurgel Rocha, presidente do conselho de administração do Grupo Guararapes, que controla a rede Riachuelo. Em nota, a Lojas Marisa afirma que a concorrência é sempre saudável, mas que é importante que todos os participantes sigam as mesmas regras de conformidade para que a disputa seja justa e fomente a economia local.

“A compra de produtos sem impostos, de forma ilegal, afeta a economia e o emprego”
Jorge Gonçalves Filho, presidente do IDV

Na outra ponta dessa discussão estão as chinesas como a Shein, que é mundialmente conhecida por oferecer roupas com valores acessíveis. Em 2022, o seu aplicativo foi o segundo mais baixado do Brasil, com 48,5 milhões de downloads. A fim de reforçar sua operação local, a varejista, acaba de inaugurar seu primeiro escritório no Brasil. “Estabelecer um escritório que possa abrigar nosso time é mais um passo dentro da nossa estratégia que busca cada vez mais ampliar nossa atuação no País”, afirma Felipe Feistler, general manager da marca no Brasil.

A evasão tributária no varejo digital deve alcançar R$ 76 e 99 bilhões em 2025

Para se adequar, a varejista chinesa firmou acordo com o governo no qual se compromete nos próximos três anos estabelecer parceria com dois mil fabricantes locais, nacionalizar 85% de suas vendas e criar aproximadamente 100 mil empregos. “O Brasil é um mercado importante para nós, estamos comprometidos em continuar a apoiar o crescimento econômico por todo País”, declara Feistler. A Shein afirma que cumpre as leis e regulamentos locais e que tem se esforçado para estabelecer parcerias com diversos fornecedores e vendedores nacionais. “Nosso objetivo é apoiar os fabricantes e fornecedores brasileiros para que possam aumentar seu alcance e crescimento”, acrescenta Felipe. Para os brasileiros, se o problema de fato for resolvido haverá uma concorrência mais justa, mas isso não significa garantia de equilíbrio de mercado. “Mesmo com a correção dos problemas atuais, o custo de um bem produzido no Brasil ainda será superior a muitos itens produzidos no exterior, especialmente na Ásia”, pondera Daniel Moreti, juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo.

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