No próximo dia 12, o Supremo Tribunal Federal julgará, em sessão presencial, se é constitucional a cobrança do diferencial entre alíquotas internas e interestaduais do ICMS – DIFAL durante o ano de 2022 (ADIs 7.066, 7.070 e 7.078).

O DIFAL, sem dúvida, é uma das principais marcas da tão propalada complexidade do sistema tributário brasileiro.

O tema, a partir de 2016, pode ser divido em três capítulos:

DIFAL 2016 até 24/02/21: com a promulgação da Emenda Constitucional (EC) n.º 87/2015, foi editado o Convênio Confaz n.º 93/2015, que passou a disciplinar a forma de cobrança do ICMS nas operações e prestações destinadas a consumidor final não contribuinte do ICMS.

DIFAL 2021: No julgamento do RE 1.287.019 e da ADI 5469, realizado em 24/02/2021, houve a declaração de inconstitucionalidade de dispositivos do Convênio Confaz n.º 93/2015 que disciplinavam a cobrança do DIFAL.

Na mesma oportunidade houve a modulação dos efeitos da decisão, de modo que se determinou que as unidades federadas poderiam manter a exigência até o final de 2021. Foi definido, ainda, que os contribuintes que possuíam ação em curso na data do julgamento (24/02/2021) estariam a salvo da exigência do DIFAL durante aquele ano.

Esperava-se, contudo, a edição e publicação de uma lei complementar, para disciplinar o tema, ainda em 2021, para que esta pudesse produzir efeitos a partir de 1º de janeiro de 2022.

DIFAL 2022: Apenas no dia 5 de janeiro de 2022 foi publicada a Lei Complementar n.º 190, regulamentando a cobrança do ICMS nas operações e prestações destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto.

Nesse período há muitas variáveis.

Muitos contribuintes haviam proposto ações até o dia 24/02/2021, de modo que só estariam obrigados a pagar o “DIFAL 2022”.

Outros perderam o timing para propositura da ação, e o fizeram nos dias seguintes ao julgamento, confiando que o STF observaria a sua jurisprudência de anos, no sentido de que a modulação teria como marco temporal para considerar as “ações em curso” o momento da publicação da ata de julgamento (RE 593849 ED-segundos e ADI 1945), e não o momento do encerramento da sessão de julgamento.

Os contribuintes inseridos neste contexto, em geral, estão gerindo o seu passivo tributário com parcelamentos, nos casos em que os estados realizam as cobranças – ainda há muitos estados que sequer têm estrutura para identificar e cobrar.

Outros têm apresentado garantias para questionar a exigência diante da prática de diversas unidades federadas de realizar a inscrição em dívida ativa e propor a ação de execução fiscal sem o prévio lançamento tributário.

Em 2022, diante do recente histórico relativo ao DIFAL 2021, a imensa maioria dos varejistas propôs ações judiciais argumentando, em especial, que a Lei Complementar n.º 190, publicada em 5 de janeiro de 2022, só poderia produzir efeitos a partir de 1º de janeiro de 2023, por força do princípio da anterioridade comum (art. 150, III, “b” da Constituição); ou, então, a partir de 90 dias contados de sua publicação, em razão da anterioridade nonagesimal (art. 150, III, “c” da Constituição Federal).

No início do ano de 2022, com a propositura das ações, houve a concessão de medidas limiares para afastar a cobrança. Todavia, em medida de “defesa das contas públicas”, as liminares foram revogadas pelos tribunais de justiça locais, com base na competência conferida pelo art. 15 da Lei n.º 12.016/09 e art. 4.º da Lei n.º 8.437/92, combinado com o art. 1.º da Lei n.º 9.494/97.

Agora, aguarda-se, ansiosamente, o julgamento pela Corte Suprema, em sessão presencial, depois do pedido de destaque da Min. Rosa Weber tê-lo retirado do plenário virtual quando o placar era de cinco votos para que o DIFAL possa ser exigido apenas para as operações ocorridas a partir de 1º de janeiro de 2023, dois votos pela exigibilidade após noventa dias da publicação da Lei Complementar n.º 190 e um voto pela incidência do DIFAL após o primeiro dia útil do terceiro mês subsequente à disponibilização do portal do DIFAL (art. 24-A, § 4º, da LC 87/96, incluído pela LC 190/2022).

Nessa última hipótese há ainda divergências se o DIFAL poderia ser exigido a partir de 02/03/2022 ou a partir de 01/04/2022, pois o Portal do DIFAL foi instituído em 29/12/2021, com base no Convênio ICMS nº 235/2021, que só produziu efeitos a partir de 01/01/2022.

Durante o ano de 2022, diante das incertezas que cercaram o tema, muitas empresas realizaram depósitos judiciais que, em um ano negativo como o presente, pode ter no levantamento dos depósitos parte da “salvação da lavoura”, caso o STF reconheça a impossibilidade de exigência do DIFAL em 2022.

Lembremos que, dentre outros problemas que prejudicam os varejistas na atualidade, destaca-se a atuação das plataformas asiáticas, que vendem para consumidores brasileiros dentro da faixa de isenção de 50 dólares e, em muitos casos, em operações que supostamente burlam o citado limite de isenção.

Diante de tudo o que ocorre no cenário econômico, espera-se que o STF, certamente pressionado pela ruína das contas públicas de muitos estados, dê atenção também à repercussão econômica e proteja a livre iniciativa (art. 170 da Constituição), determinando, diante da instituição de tributo novo por meio da Lei Complementar n.º 190/2022, a impossibilidade de sua exigência em 2022.

Que venha uma decisão do STF que, além de respeitar os inúmeros fundamentos jurídicos para afastar a exigência do DIFAL em 2022, zele também pela livre iniciativa, diante da inegável repercussão econômica do tema!!!

E em 2023?

Não há espaço, ao menos em tese, para se estender a discussão para o exercício financeiro atual. Tanto é assim que a Nota técnica 2022.005 do Confaz restabeleceu, a partir de 03/04/2023, a determinação de inclusão, na nota fiscal eletrônica, das informações correspondentes ao ICMS devido para a Unidade Federada de destino nas operações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte (Campo NA01-20 – grupo “ICMSUFDest”), sob pena de não emissão do documento fiscal.

Portanto, os varejistas terão de conviver (e absorver) esse diferencial de alíquotas de ICMS durante o ano corrente, o que poderá acarretar o aumento do inadimplemento e, em alguns casos, a prática de sonegação.

Para o futuro, espera-se que venha uma reforma tributária coerente, que afaste, de forma racional, este elemento de distorção do segmento varejista on line, que é gerador de incertezas, insegurança jurídica e litigiosidade.

*Daniel Moreti, sócio do Fonseca Moreti Advogados, é advogado, doutor e mestre em Direito Tributário pela PUC/SP, professor de Direito Tributário (IBMEC, IBET, EPD, ESA, EBRADI e outros). Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo. Membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/SP – Subseção Pinheiros

Fonte: Estadão.

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